sábado, 25 de junho de 2011

Natimorto

Você me matou. Você me matou e realmente acha que merece um pingo de piedade? Bastardo. Ingrato. Imbecil, és um grande filho da puta e eu? Eu acho que te odeio.
Todos sabem que meu lugar nunca foi outro a não ser o limbo, mas antes eu vagava num limbo mais animado e antes eu tinha até casa, na Terra. Agora eu vago pelo infinito onde o ponto que parti jamais será o ponto onde vou chegar, e eu nunca vou chegar a nenhum lugar, porque você preferiu me matar a me deixar cometer maldades suficientes para ir pro Inferno. Por quê?
Eu fico traumatizada aqui, essa imensidão é cinza escura, não há paredes, não há ninguém e eu tenho medo. Como poderei sair daqui? Imagina ficar aqui pra sempre? Imagina nem medo mais sentir, ficar nula, vazia. Virar uma árvore sem frutos, uma mulher sem útero, um homem sem limites.
O Oceano de tristezas na metralhadora cheia e mágoas. Estou fadada, muito obrigada a ficar perdida com todos os pelos e porquês crescendo. Na verde este cinza vai me trazer à filosofia. Nada escuto, nada posso falar. Eu só ouço meus pensamentos e já esqueci como era minha voz, como eram os rostos e os gostos que eu tanto gostava de sentir. Existe apenas uma tentação de cobrar de mim mesma algo que não posso dar. O lar da burrice é o limbo que somente eu, e mais milhões almas invisíveis – como a minha -, sabem como é passar. Nunca, nunca pensei que uma vida nula ia causar num existencialismo nulo e achava que essas almas nulas como a minha iam pro céu, porque não atrapalhei nem ajudei, apenas existi – ou nem isso.
A verdade é que, caro assassino, você me condenou a uma eternidade e variedade de coisas. O nada tem significado sim, e este nada é um nada muito cheio, com ausência de conteúdo, mas enriquecido em passos para andar. E você ainda acha que me interrompe.
Não sinto fome, não sinto vontade de nada. Acho que me acomodei mesmo neste lar da burrice, vou ficar mais quem sabe, para mais uma caminhada entediante. Para nem mais um livro de Kafka.
Deixe-me ir embora, estou cansada de você, prometa nunca mais mandar ninguém ao limbo. Bonecas infláveis podem substituir todas as mães e filhas que você traçou, otário. E um beijo, e eu espero que você venha pra cá também, para esta merda de Limbo onde você me largou, venha provar do veneno que me condena pra sempre e venha apreciar a mais insensata solidão de existir e estar morto. Natimorto serás.

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